05 abril 2008

"Normas sociais, alienação e mudança"

Há uns tempos uma amiga tinha como seu nome no messenger a seguinte frase, ou algo parecido: "Todos nascemos diferentes, e tornamos-nos iguais ao longo da vida". Tenho andado a pensar nisto, e decidi-me por deixar aqui algumas ideias, para quem quiser pensar um pouco, nomeadamente sobre si próprio e sobre a sua vida... Como dito noutro post, escrevo para anormais, porque os normais não questionam nada.
Que a sociedade tem regras, imagino que não seja novidade para ninguém. [...] A questão relevante, no entanto, respeita a todo o conjunto de regras (regras em termos de valores e normas, para simplificar) que não são de facto indispensáveis ao simples funcionamento da sociedade, em sentido lato, mas que ainda assim existem. Mas se assim é, então existem para quê?Existem para homogeneizar os indivíduos, alienando-os, para reforçar a aceitação do sistema social vigente. [...] E porque é que o sistema necessita de homogeneizar e alienar os indivíduos? Porque quanto mais "iguais" uns aos outros forem, quanto mais semelhantes forem sonhos, objectivos, interesses, modos de vida, etc, menos o indivíduo se questionará sobre formas alternativas. Fala-se anteriormente dos indivíduos em si mesmos, mas no plano colectivo é que se encontra o cerne da importância da alienante homogeneização: quanto menos os indivíduos se questionarem a si próprios, menos questionarão o que os rodeia, portanto em ultima análise menos questionarão o sistema social vigente.Portanto, o sistema precisa, para (sobre)viver, de nos tornar a todos muito "iguaizinhos" uns aos outros. Ou seja, precisa que o maior número possível de indivíduos aceite uma mesma forma de vida que, para que nada questionem, interessa que seja fútil, vazia de sentido, estupidificada ou, para usar um conceito mais exacto, alienada.Daqui advêm regras sociais informais, mais ou menos explícitas, que têm por objectivo a nossa alienante estupidificação. E é por isto que, nascendo todos diferentes, acabamos por lentamente nos tornar todos iguais (ou não, é como a utopia...), porque o sistema de tal necessita para se manter.Todos já tivemos sonhos, objectivos ou simplesmente interesses (para mim a distinção prende-se com o prazo a que podem ser alcançados) dos quais desistimos. Já desejámos modos de vida dos quais abdicámos. Uns teriam gostado disto, outros daquilo, etc. E desistimos. Porquê? Porque não eram comuns, porque eram diferentes do que nos é ensinado a sonhar e ter como objectivo, porque eram diferentes do que nos enfiam na cabeça que deve ser o nosso modo de vida, porque eram interesses que os normais não têm. Falamos de regras, portanto. Regras que definem o que é normal e o que não é.O que é normal é tirar um curso ou arranjar um trabalho. O que é normal é encontrar a pessoa da nossa vida. O que é normal é casar com ela (de preferência pela igreja). O que é normal é ter filhinhos. O que é normal é trabalhar a vida toda. O que é normal é educar os nossos putos a serem iguais a todos os outros. O que é normal é deixar-lhes alguma coisinha quando morrermos... É isto que é normal, o cerne da nossa individualidade, se disto difere é anormal, e deve portanto ser corrigido. E as regras existem para impingir esta insípida normalidade.De quanto já desistiu cada um de nós, da nossa identidade individual, do que fazia de cada um um ser único, para se encaixar nesta sociedade idiota? Um gostaria de viajar pelo mundo, sobrevivendo de biscates, mas isso não é vida para ninguém... [...] mas isso são delírios da juventude...E porque é que desistimos? Porque as regras não se limitam a existir, independentemente da nossa aceitação ou não. São-nos impostas coercivamente. Afinal, se o sistema tanto de tal necessita, não poderia simplesmente ficar à espera que as aceitássemos ou não. Assim sendo, impinge-as, pressiona implacavelmente para que as aceitemos.
A maioria, de facto, aceita-as sem minimamente se questionar. Para esses tudo é simples, nunca se perguntam sobre como mil coisas poderiam ser diferentes. Abençoados sejam os pobres de espírito, pois deles será o Reino dos Céus... ou não. De qualquer modo, já devem ter desistido de ler isto, portanto não importa.
[...]
Moral da história: a miserável sociedade em que vivemos, por sua vontade ou nos estupidifica ou nos destrói. Cabe a cada um encontrar em si e noutros a força para resistir. Se tudo tentar recusar, ou definhará, ou acabará como este último exemplo: recusar-se-á a si próprio e definhará à mesma. Cada um terá que encontrar o seu ponto de equilíbrio, para viver a sua vida tal como a deseja sem ser alienado nem se auto-alienar de si mesmo. Quem já foi totalmente alienado, não terá lido isto até ao fim; quem já encontrou o equilíbrio, ainda bem que o conseguiu, quem não o encontrou, espero que o venha a conseguir.
Alfredo P. Campos

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